sexta-feira, 28 de abril de 2017

O show tem que continuar...

Hoje, desativei o alarme do celular que me despertava às 02h50, desde o dia 1º de abril de 2016. Algumas vezes, parecia que ele tocava antes mesmo de eu ter conseguido dormir, e talvez isso até tenha acontecido. Mas nunca perdi a hora, nunca atrasei durante este período. Qualquer pessoa que me conheça minimamente, vai duvidar que não atrasei no último ano, mas é verdade. A responsabilidade de estar produzindo o principal programa do rádio brasileiro corrigiu até um dos meus defeitos crônicos. Já até tentei achar explicações patológicas para os meus atrasos, mas nunca consegui convencer aqueles que já me esperaram até por horas em compromissos marcados por mim. Neste período, trabalhei com o maior comunicador de rádio do Brasil, mas esse Antonio Carlos todo mundo conhece. Porém, tive a oportunidade de conhecer o profissional por trás do microfone. E com esse aprendi muito! Ele nunca faltou e nem chegou atrasado. Não dorme tarde e usa 8 despertadores em volta da cama, para não correr o risco do "cochilo de só mais 5 minutinhos" que sempre acaba de forma trágica. Aprendi como se faz um programa de rádio totalmente dedicado ao ouvinte, sem que o gosto pessoal do comunicador interfira no conteúdo. Nunca ouvi o Antonio Carlos falar "o meu programa".  Também aprendi o que é uma equipe de verdade, daquelas que são imbatíveis, tipo a seleção brasileira da Copa de 1970. Mas para dar certo, todos têm que desempenhar as suas funções com perfeição.
Se você acha que sou uma pessoa bacana, é porque não trabalha comigo. Quando a luz vermelha "no ar" acende no estúdio, me transformo no cara mais perfeccionista e sério (chato) do planeta. Já me aborreci com bons amigos que não me levaram a sério enquanto eu produzia um programa. Se algo dá errado, minha coluna começa a travar e a cabeça a doer. Como não gosto de me sentir assim, só tenho a opção de fazer o melhor possível, mesmo que isso signifique regravar a mesma reportagem 8 vezes, até achar que tirei o melhor de mim. Acredito que a seriedade (até exagerada) com o trabalho tenha sido responsável pelo respeito que o Antonio Carlos demonstrou ter por mim, desde quando cobri as férias do Gelcio Cunha pela primeira vez, em janeiro do ano passado. Não sou amigo pessoal do Antonio Carlos, por isso me limito a falar dele apenas como profissional. Mas pelo pouco que sei, o caminho que ele percorreu até se tornar o radialista mais bem sucedido do país, daria um belo livro. Como profissional, ainda não conheci e provavelmente não conhecerei alguém mais disciplinado e focado no trabalho.

No entanto, admito que no início não achava que seria assim. Fiz jornalismo acreditando no dever cívico da profissão. Por isso, sempre quis ser repórter, prestar serviço, denunciar as mazelas da nossa sociedade, ser a "voz do outro que há dentro de mim", como canta o Frejat num trecho da música 'Política Voz' do Barão Vermelho. Não é a toa que escolhi essa música para tocar na minha colação de grau. Vinte dias antes de assumir a produção do 'Show do Antonio Carlos', estreei na programação da Rádio Globo o quadro 'Conta Pra Gente'. Era o resgate da essência do trabalho construído pelos grandes repórteres que passaram pelo Amarelinho da Globo, como Gelcio Cunha, Robson Aldir e Alberto Brandão. Em apenas 3 semanas, resolvemos os problemas de muitas pessoas, chorei dentro do Amarelinho após entrevistar uma senhora que havia perdido tudo por causa de uma forte chuva e bati boca com um prefeito da Baixada Fluminense que tentou insinuar que a minha denúncia não era verdadeira. Estava no auge do meu sonho de estudante. Quando soube que abandonaria o quadro para ser produtor, não pensei duas vezes: fui à sala do diretor para comunicar que pediria demissão. Além do diretor, estava na sala também o meu coordenador. Os dois ficaram surpresos e tiveram a paciência necessária para me fazerem reconhecer que estava sendo impulsivo e imaturo. Sou grato aos dois por isso. Achei que era o fim da minha carreira como repórter. Mas, na verdade, era apenas um recomeço na forma de fazer jornalismo e prestar serviço. Em poucas semanas, percebi que assumir a produção do programa nº 1 do rádio brasileiro era uma honra, daquelas que merecem destaque no currículo. Mesmo sendo fã e ouvinte do Antonio Carlos, nunca me imaginei trabalhando com ele. Numa mesma edição do programa, eu gargalhava até doer os músculos da face brincando com a Juju e o Gelcio, mas também me emocionava com as histórias contadas no quadro 'As canções do Rei e as histórias de cada um'.
Já que o programa acabou, vou fazer uma confissão: enviei uma carta para a produção do programa me passando por um ouvinte, pois queria me despedir de alguém especial no quadro 'As canções do Rei...'. Toda a história foi real, apenas os nomes não eram verdadeiros. A responsável por esse quadro era a Aldenora Santos, a Pudica. Ela recebia as cartas e e-mails dos ouvintes e passava as histórias para linguagem radiofônica. O mais engraçado foi ela me falando "Cantharino, você leu a história desse ouvinte? Que emocionante!". O único que soube na época que era a história da minha vida foi o Antonio Marcos Pires, o Toninho Bondade, que atualmente é um dos meus melhores amigos. Não comentei com ninguém que faria isso e utilizei nomes que só faziam sentido para mim e para a pessoa. Mas surpreendentemente, logo após o fim do quadro, recebi a seguinte mensagem de um amigo de infância que era ouvinte do programa: "Bela homenagem, amigo!"
(Pausa para ouvir novamente a gravação)
Na mesma época, o Gelcio Cunha me provou que é uma das pessoas com o coração mais belo que habitam este mundo. Dos integrantes do programa, sempre fui o primeiro a chegar à rádio. Um dia, o Gelcio chegou e não respondi o seu "bom dia" com a mesma alegria de sempre. Mesmo enrolado com a pauta das entrevistas (ele também é a pessoa mais enrolada que eu conheço), me chamou na mesa dele e perguntou o que estava acontecendo. Respondi qual era o motivo da minha tristeza. E quando menos eu esperava, ele me abraçou forte e começou a chorar. Durante uma semana, ele fez questão de ir tomar café da manhã comigo depois do programa, no bar ao lado da rádio. Admiro muito a Juçara, a Aldenora e a Zora, elas são as melhores no que fazem, mas nunca fomos muito próximos.
A partir da minha entrada na equipe, começamos a fazer reuniões de pauta após o programa, para decidirmos os temas e entrevistados do programa seguinte. Participava também da reunião a minha amiga e chefe Heloisa Paladino. Era uma verdadeira terapia! A gente ria até perder o ar com o Antonio Carlos contando histórias sobre seus quase 60 anos profissão. A cada reunião, ele nos enriquecia de conhecimento sobre a história dos meios de comunicações com seus heróis e vilões.
Deixei a parte mais importante para o final: os ouvintes! Os ouvintes do 'Show do Antonio Carlos' são diferentes, eles são amorosos, fiéis e nos tratam como membros da família. Até hoje, recebo ligações de pessoas que falam que oraram por mim quando souberam do assalto que sofri em janeiro. Pessoas de todas as classes sociais e idades. Algumas pessoas escolhiam comemorar seus aniversários com a gente no estúdio. Compravam bolo, salgadinhos, refrigerante e apareciam na rádio às 06h da manhã. Engordei alguns quilos por causa disso. Ah, que carinho gostoso! Alguns se tornaram amigos muito além do estúdio. Guardo com carinho todas as lembranças que ganhei nesses 12 meses. Hoje, dezenas de pessoas se espremeram no estúdio para acompanhar a última edição do programa. Foi emocionante! Apresentei a edição de 08h30 do jornal 'Rio em 1 Minuto' chorando, literalmente. Como prêmio deste período, fica a honra de ter produzido o belo programa especial de 40 anos do 'Show do Antonio Carlos, no dia 17 de março deste ano.

Farei parte do projeto da 'Nova Rádio Globo'. A partir da próxima segunda-feira, já estarei numa nova função e em novo horário, trocando às 4 da manhã pelas 4 da tarde. Conto com a torcida e compreensão dos amigos que ganhei neste último ano.
Ao Antonio Carlos e à Juçara, que deixaram a Rádio Globo hoje, desejo que muitos microfones se abram, seja o da Rádio Tupi ou de qualquer outra emissora. Estarei sempre na torcida por vocês, pois como diz o refrão da canção que escolhi para tocar no programa de hoje, "o show tem que continuar".
Muito obrigado por tudo e a todos que participaram deste momento especial da minha vida!

terça-feira, 18 de abril de 2017

Obrigado pela companhia!

Pensei em escrever este texto há duas semanas, quando o fato aconteceu, mas o tempo estava escasso na primeira metade deste mês. E como hoje é comemorado o 'Dia Nacional do Espiritismo', talvez essa era a deixa que eu precisava para separar um tempo para escrever sobre, o que pra mim é sempre libertador. Sou católico, sempre fui. Comecei a ser praticante aos 15 anos de idade, quando fiz Crisma. Logo em seguida, me tornei coordenador de Crisma e catequista na Paróquia Divino Salvador. Foram 5 anos dentro da igreja durante todos os fins de semana. Saí do trabalho pastoral meses antes de completar 20 anos, mas nunca deixei de crer na minha religião. Por causa disso, sempre fui muito cético com outras religiões. Mas respeito todas as religiões, sem exceção, pois aqui em casa sempre reinou o livre arbítrio religioso. Meu saudoso pai era diácono da Igreja Presbiteriana, enquanto minha mãe frequentava um centro espírita. 
Este texto não é religioso (ou não era pra ser). É sobre o meu pai, o Elton John e certezas.
Nos últimos 4 anos de vida, meu pai passou dois longos períodos internado. O primeiro foi em 2005, e o derradeiro em 2008. Durante as duas internações, havia um rádio ao lado da cabeceira da maca, que quando não estava sintonizado na JB FM, principalmente no horário do Iseumar Pereira, pois era o locutor preferido dele, estava tocando um CD de grandes sucessos do Elton John. Na década passada, era normal fazer cópias de CDs e deixar os originais guardados em casa. Eu carregava no carro um case só com cópias dos CDs que tinha em casa. O CD original do Elton John é da minha mãe, e como ela é muito cuidadosa e até um pouco ciumenta com os seus pertences, fiz um cópia da coletânea para não ter problema. Ainda dei um toque pessoal, adicionando duas canções que eu achava que faltavam no CD: 'I Want Love' e 'Empty Garden'.
Uma semana após a morte do papai, em janeiro de 2009, o Elton John se apresentou no Brasil. E o show de São Paulo foi transmitido ao vivo pela TV Globo. Dois dias depois, o show foi no Rio. Se foi difícil assistir ao show pela TV, não havia a mínima condição de ir à Apoteose.
Quando o papai saiu do hospital pela primeira vez, eu fazia questão de colocar o CD do Elton John para ele ouvir no carro. Na verdade, sou um ótimo DJ automotivo. Sempre fiz playlists para cada situação: ida e volta para o trabalho, programas com amigos, encontros amorosos, viagens e por aí vai...
Desde a morte do papai, guardo a cópia da coletânea do Elton John como um tesouro. Infelizmente, a mídia se deteriorou com o tempo e algumas músicas não tocam mais.


Depois de 2009, o Elton John se apresentou novamente no Rio em 2011, 2014 e 2015. Não criei coragem nessas ocasiões. Mas com o anúncio dos shows no Brasil neste ano, decidi que havia chegado a hora. O Elton John já passou dos 70, daqui a pouco ele se aposenta e eu ficaria eternamente frustrado por não ter ido em nenhum show. Foi o mesmo pensamento que tive ao comprar o ingresso para o Rolling Stones, em 2015, e para o Black Sabbath, no ano passado.
Já assisti aos shows de todos os artistas que mais admiro: Soundgarden, Chris Cornell, Pearl Jam, Stone Temple Pilots, Oasis, Faith No More, Alice in Chains, Foo Fighters, Smashing Pumpkins, Dave Matthews Band, Ira!, Titãs, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso, Lobão, Jay Vaquer, Pedro Mariano, Paulinho Moska e Ney Matogrosso. Já assisti a alguns desses artistas ao vivo mais de 5 vezes. Mas 3 foram especiais, verdadeiras realizações de sonhos da adolescência: Soundgarden, o primeiro do Chris Cornell e o primeiro do Pearl Jam. Porém, o que senti durante o show do Elton John, no último dia 1º, foi algo que até então era desconhecido. Ao mesmo tempo que doía de saudade do papai, como nunca antes havia acontecido, eu conseguia sentir a presença dele no show comigo. Chorei durante a primeira meia hora inteira do show. Minhas lágrimas copiosas só não chamaram tanta atenção dos fãs ao meu redor, pois o show aconteceu sob um temporal que atingiu o Rio naquela noite. Enquanto cantava com a alma canções como 'Daniel', 'Tiny Dancer', 'Rocket Man', 'Skyline Pigeon' e 'Someone Saved My Life Tonight', sentia que estava pagando uma dívida, assistindo ao show por mim e pelo papai, pois estávamos "juntos" novamente naquele momento.


O show terminou e voltei para casa em êxtase e sem voz. Na noite do dia seguinte, mostrei as fotos e vídeos do show para a minha mãe e minha irmã. Contei o que tinha sentido, e em seguida, percebi que a minha mãe estava emocionada. Ela virou para a minha irmã e perguntou: "Será que foi pra isso que ele veio?". Minha irmã respondeu afirmativamente. Fiquei sem entender o que estava acontecendo e questionei a minha mãe. Ela respondeu que, na noite anterior, enquanto eu estava no show, ela havia sonhado com o papai, o que não é comum acontecer. No sonho, ele estava com uma ótima aparência, muito bem vestido com um terno preto e uma camisa verde. Mas minha mãe ficava brava, pois ele se arrumava e saía de casa antes do almoço de domingo sem dizer o destino. Não me restam dúvidas, pagamos a dívida juntos, pois ele estava comigo no show.